Os pequeninos parecem que já sabem e procuram, na primeira oportunidade, se “abarrotarem” desse alimento rico e gratuito.
São
vários os estudos que atrelam o aleitamento materno a uma vida
saudável. Salientam o seu poder na prevenção e combate às ameaças
externas, mesmo porque, o leite materno é rico em factores imunológicos
como anticorpos, macrófagos, neutrófilos, linfócitos, lactoferrina,
lisosima e factor bífido que protegem a criança (1;9).
A
amamentação além de nutrir, proteger e favorecer o desenvolvimento
físico e cognitivo dos bebés, favorece a criação de um forte vínculo
afectivo entre mãe e filho, onde laços de amizade e confiança são
construídos e fortalecidos. Logo podemos afirmar que a amamentação não
só proporciona nutrientes essenciais. É um momento único e rico de
carinho, afecto, doação e troca. É uma condição básica para o
estabelecimento de vínculos emocionais. É uma prática natural com
repercussões futuras.
Muitos
são os estudos de John Bowlby sobre a teoria da vinculação. Destacam a
necessidade humana de estabelecer ligações afectivas de proximidade ao
longo da vida, tendo o objectivo alcançar a segurança que permite
explorar o “self”, os outros e o mundo; os pais são os co-autores da
vida de seus filhos, preenchendo lacunas, projectando o futuro.
Existem pesquisas que mostram que 90% das mães portuguesas iniciam o aleitamento materno. Contudo, essas
mesmas pesquisas evidenciam que “quase à metade dessas mães desistem de
amamentar muito precocemente”, o que mostra que a grande parte não
consegue cumprir o seu projecto de dar de mamar aos seus bebés (2).
A Organização Mundial de Saúde (OMS) (9)
recomenda o aleitamento materno exclusivo até os seis meses de idade e
associado a outros alimentos até os dois anos ou mais. É clara quando
diz que leite materno contém tudo que a criança necessita até os seis
meses, não sendo necessário qualquer complemento alimentar salvo
recomendações de técnicos de saúde altamente capacitados. Coloca que
introduzir outros alimentos, antes dos seis meses, pode causar alguns
prejuízos para a criança e cita: “maior número de episódios de diarreia;
maior número de hospitalizações por doenças respiratórias; risco de
desnutrição; menor absorção de nutrientes importantes do leite materno, como o ferro e o zinco e redução na duração do aleitamento materno.
LAMOUNIER, citado por Amorim e Andrade (3)
refere que quando alimentos complementares são introduzidos antes dos 6
meses de vida, a criança passa a ingerir menos leite humano o que pode
trazer riscos como alergias alimentares, aumento da taxa de
morbimortalidade e uma maior incidência de doenças
crónicas/degenerativas na idade adulta.
A Sociedade Brasileira de Pediatria (4) disponibiliza um esquema para introdução dos alimentos complementares.
Faixa etária Tipo de alimento
Até completar 6 meses: Aleitamento materno exclusivo
Ao completar 6 meses Leite materno, papa de fruta, papa salgada, ovo, carne
Ao completar 7 meses Segunda papa salgada
Ao completar 8 meses Gradativamente passar para alimentação da família
Ao completar 12 meses Comida da família
Fonte: Adaptação da Sociedade Brasileira de Pediatria (2006)
Muitos
países conseguiram reduzir a taxa de mortalidade infantil (TMI) através
de programas de imunização mais eficientes, identificação e tratamento
atempado de infecções, melhoria na oferta de atendimento/acompanhamento
pré-natal e pós-parto e principalmente através da inclusão de programas
educativos promotores do aleitamento materno (5).
Como
é sabido as mamas são estruturas complexas compostas por tecido
glandular “glândulas túbulo-alveolares” constituídas por lóbulos. Estes
últimos são formados por alvéolos que têm finalidade à produção de
leite. Durante a gravidez as mamas aumentam de tamanho, as aréolas ficam
mais escuras e as veias mais visíveis. O sistema de ductos (canais)
aumenta e diferencia-se assim como os alvéolos, lóbulos e lobos. Nos
primeiros dias pós-parto a produção de leite é pequena, porém é rica em
proteínas e tem menos gorduras se comparado com o leite produzido a
partir do sétimo ao décimo dia pós-parto. É importante que durante a
amamentação a criança esvazie bem a mama visto que o chamado “leite
posterior” contém mais calorias e por isso satisfaz mais o bebé. Além de
um local tranquilo, um posicionando adequado e uma boa “pega” por parte
da criança é recomendado que seja fornecido o alimento sem restrições de horários e de tempo - “amamentação em livre demanda”. Uma boa pega requer um abocanhamento não apenas do mamilo como também da auréola formando assim um lacre perfeito.
Estudos
realizados evidenciaram que o uso da mamadeira (biberão) e da chupeta
favorecem o desmame precoce e podem ser uma fonte de contaminação.
PALMER (6) considera que o uso da chupeta está associado a
uma maior ocorrência da candidíase oral, otite média e de alterações do
palato.
A Organização Mundial da Saúde (OMS) (7) destaca quatro pontos-chave que caracterizam o posicionamento e pega adequados:
Posicionamento adequado
1. Rosto do bebé de frente para a mama, com nariz na altura do mamilo;
2. Corpo do bebé próximo ao da mãe;
3. Bebé com cabeça e tronco alinhados (pescoço não torcido);
4. Bebé bem apoiado.
Pega adequada
1.Aréola visível acima da boca do bebé;
2. Boca bem aberta;
3. Lábio inferior virado para fora;
4. Queixo tocando a mama.
Para
haver uma óptima produção de leite é necessário que a mãe esteja bem
nutrida e hidratada. É muito comum observar um aumento do apetite e um
maior consumo hídrico, devendo este não ser exagerado. No caso das mães
vegetarianas é importante alertar para importância de ingerir proteínas e
vitaminas em quantidade suficiente.
Alguns estudos citam algumas recomendações para as mães nesta fase:
- Consumir dieta variada, incluindo pães e cereais, frutas, legumes, verduras derivados do leite e carnes;
- Consumir três ou mais porções de derivados do leite por dia;
- Esforçar-se para consumir frutas e vegetais ricos em vitamina A;
- Certificar-se de que a sede está sendo saciada;
- Evitar dietas e medicamentos que promovam rápida perda de peso (mais de 500g por semana);
- Consumir com moderação café e outros produtos cafeinados.
O
comportamento dos bebés é muito variável, visto serem diferentes uns
dos outros. Cada um tem sua própria personalidade, sensibilidade,
vivenciam momentos diferentes, tanto durante a vida intra-uterino como
durante o parto, e tem direitos específicos assegurados. A Declaração de Barcelona sobre os direitos da mãe e do recém-nascido de 2001 refere que o recém-nascido “é
uma pessoa com direitos específicos, que ele não pode exigir por si
próprio devido à sua imaturidade física e mental. Estes direitos impõem
obrigações e responsabilidades à sociedade, que as instituições
legislativas e executivas de todos os países devem reforçar. É um
ser livre, com dignidade, com direito à vida e a cuidados de saúde
adequados, que lhe permita um óptimo desenvolvimento físico, mental,
espiritual, moral e social”.
O enfermeiro tem o papel de facilitador do processo de transição para maternidade. Desenvolve competências globais e específicas com o intuito de ajudar a mãe a delinear um projecto de maternidade eficaz. Utilizando
linguagem simples e acessível, este técnico incentiva e apoia o
aleitamento materno; procura diminuir a insegurança, desconforto,
sofrimento e sentimentos de incompetência; detecta precocemente
situações de risco e garante uma assistência multidisciplinar rápida e
segura; promove espaços para troca de ideias e sentimentos, esclarecendo
dúvidas, ajudando ultrapassar obstáculos/dificuldades; têm em atenção a
história, os hábitos, costumes, as particularidades de cada um e uma
visão ampla da saúde; orienta para práticas fundamentadas em bases
científicas. Segundo a UNICEF 2002 (7) os enfermeiros devem
estar ao lado da mãe, orientando-a no início do aleitamento materno e
ajudando-a na busca de soluções para suas dúvidas.
Estes
profissionais também estão atentos às crianças com necessidades
especiais, mães e bebés em situação de vulnerabilidade, sobretudo em
questões complexas como maus-tratos, negligência, abandono ou qualquer
outra situação de perigo eminente. Procuram responder de forma adequada e
rápida orientando-se segundo os princípios éticos e deontológicos da
profissão, em conjunto com outros profissionais de saúde e instituição,
observando atentamente leis e recomendações específicas como por exemplo
a Lei de Protecção de Crianças e Jovens em Perigo, entre outras.
A
família é a primeira célula de socialização dos indivíduos. É um espaço
emocional e afectivo. É o primeiro ambiente que prepara verdadeiramente
o homem para a relação com o seu semelhante. (8)
Durante
suas intervenções assistenciais/educativas, o enfermeiro deve procurar
incluir às pessoas mais significativas para a gestante/puérpera, como o
companheiro, a mãe, os filhos mais velhos, entre outros, para que estes
possam ajuda-la de forma segura em momentos de dificuldade.
A OMS (9) disponibiliza alguns recursos muito utilizados no aconselhamento e um plano de actuação:
- Praticar não só a comunicação verbal como também à não-verbal (gestos, expressão facial, entre outras).
- Remover barreiras como mesa, papéis, promovendo uma maior aproximação entre a mulher e o profissional de saúde;
- Usar linguagem simples e acessível;
- Dar espaço para a mulher falar. Para isso, é necessário dedicar tempo para ouvir, prestando atenção no que a mãe está dizendo e no significado de suas falas.
-
Demonstrar empatia, ou seja, mostrar à mãe que os seus sentimentos são
compreendidos, colocando-a no centro da situação e da atenção do
profissional;
- Evitar palavras que soam como julgamentos, como, por exemplo, certo, errado, bem, mal, etc.
- Aceitar e respeitar os sentimentos e as opiniões das mães, sem, no entanto, precisar concordar ou discordar do que ela pensa;
- Reconhecer e elogiar condutas correctas realizadas pela mãe.
- Oferecer poucas informações em cada aconselhamento, prendendo-se a situação do momento;
- Fazer sugestões em vez de dar ordens;
- Oferecer ajuda prática;
- Conversar com as mãe sobre as sua condições de saúde e a do bebé, explicando-lhe todos os procedimentos e condutas.
O plano de actuação deve incluir nos seguintes níveis:
- Promover um crescimento e desenvolvimento adequado ao recém-nascido;
-
Educar a família para que proporcione ao lactente nutrientes
suficientes para crescer prevenindo a desnutrição, obesidade e alergias;
- Estruturar o ambiente para o desenvolvimento das interacções da criança com o meio;
- Desenvolver nos pais capacidades para cuidar a criança, promovendo a saúde e prevenindo a doença.
Para
finalizar é importante que todas as mães estejam conscientes da
importância do aleitamento materno nos primeiros meses de vida; que
sejam incentivadas e devidamente informadas sobre seus direitos; que
existam políticas de saúde claras de promoção ao aleitamento materno,
principalmente nos países onde persistem taxas assustadores de
mortalidade infantil; que os sistemas de informação em saúde forneçam
dados precisos para priorização de necessidades; que os técnicos de
saúde recebam formação adequada a ponto de sentirem capacitados para
prestar uma assistência totalmente livre de riscos; que a saúde seja um
tema dominante nos diferentes discursos sociais e políticos e que todas
as crianças sejam consideradas não só parte do processo produtivo da
espécie humana, mais também o resultado de uma maturação psicológica
influenciada pelo ambiente social, cultural, económico, político,
geográfico…pelo mundo.
Bibliografia
1- GRASSI, M.S; et.al - Fatores imunológicos do leite humano. Universidade de São Paulo. São Paulo, SP, Brasil Pediatria (São Paulo) 2001. Disponível: http://www.pediatriasaopaulo.usp.br/uplo ad/pdf/532.pdf
2- UNICEF/Comissão Nacional Iniciativa Hospitais Amigos dos Bebés - Manual de aleitamento materno Comité Português. Edição 2008 Depósito Legal: 176764/02 ISBN: 96436 Disponível: www.unicef.pt/docs/manual_aleitamento.pdf
3-AMORIM, M.M; ANDRADE, E.R. - Atuação do Enfermeiro no PSF sobre Aleitamento Materno. Vol 3, Nº 9, 2009. Disponível:
4-Sociedade Brasileira de Pediatria -Manual de orientação para alimentação do lactente, do pré-escolar, do escolar, do adolescente e na escola. Departamento Científico de Nutrologia. 2006. Disponível:
5-Informe de Atenção Básica – Mortalidade Infantil Ano 1, Agosto 2000. Disponível:
6-PALMER, B. - The influence of breastfeeding on the development of the oral cavity: a comentary. J. Hum. Lact., [S.l.], v. 14, p. 93-8, 1998.
7-UNICEF - Como o leite materno protege os recém-nascidos. Documento sobre o mês de amamentação. Disponível:
8-D’AGOSTINO, F - Elementos para una Filosofia de la Família, Madrid, RIALP 2002
9-Ministério da Saúde - Saúde da Criança: Nutrição Infantil. Cadernos de Atenção Básica Nº23. Brasília, Distrito Federal. 2009. Disponível:
10-DINIZ, R.L.P. Avaliação
do Programa de Incentivo ao Aleitamento Materno do Hospital Geral César
Cals um Hospital Amigo da Criança em Fortaleza – Ceará. (Dissertação de Mestrado). Fortaleza-CE, 2003. Disponível: http://www.esp.ce.gov.br/paginas/Dissert ações_Teses/AvaliacaoProgIncentivoAleita mentoHGCC.pdf.
11-Lei de Protecção de Crianças e Jovens em Perigo - Lei n.º 147 / 99 de 1 de Setembro.
12-Mercer, R. (2004). Becoming a mother versus maternal role attainment. Journal of Nursing Scolarship. 36(3), p. 226-232.
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